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O Antiterrorismo e o Contraterrorismo
O combate ao terrorismo é conduzido em duas grandes vertentes: o antiterrorismo e o contraterrorismo. O antiterrorismo compreende a condução das medidas de caráter eminentemente defensivo que objetivam a redução das vulnerabilidades aos atentados terroristas.
Já o contraterrorismo compreende a condução das medidas de caráter eminentemente ofensivo, tendo como alvo as diversas organizações terroristas em presença, a fim de prevenir, dissuadir, ou retaliar atos terroristas.
As atividades desenvolvidas pelos órgãos de segurança nos aeroportos; as normas que regulam o relacionamento entre passageiros e tripulações nos vôos comerciais; a fiscalização exercida pelos órgãos de controle de migração e receita nos portos, aeroportos e fronteiras; a segurança instalada na proteção aos serviços públicos essenciais, bem como o patrulhamento das principais vias de transporte e comunicações, todas estão no contexto do antiterrorismo.
As operações desencadeadas por elementos especializados visando a captura de integrantes das organizações terroristas, bem como aquelas efetuadas para liberar instalações ou reféns que venham a cair sob o controle dessas organizações, estão no contexto do contraterrorismo.
A condição indispensável para o êxito é que o planejamento e a execução das ações sejam baseados num sólido e bem estruturado sistema de inteligência. A informação precisa e oportuna, alicerçada numa análise apropriada (resultado inclusive de um intercâmbio adequado, pertinente e oportuno com as mais diversas agências de inteligência internacionais) é o fundamento básico de uma bem sucedida campanha de combate ao terrorismo. A busca e a coleta multidisciplinares de informações, envolvendo todas as áreas, política, econômica, psicossocial, militar e cientifico-tecnológica, são básicas tanto na condução das operações preventivas quanto nas repressivas.
Nesse contexto, avulta a necessidade de uma plena integração entre os órgãos voltados para a segurança nacional e aqueles voltados para a segurança pública, em todos os níveis, federal, estadual e municipal. Há que se destacar que a experiência, cada vez mais, tem demonstrado uma nítida preponderância da inteligência humana sobre a de sinais e a de imagens.
Entretanto, combater o terrorismo tem se mostrado uma tarefa de crescente complexidade, em função, sobretudo, do caráter difuso e transnacional da atual ameaça terrorista.
O que se observa, na atualidade, em muitos países, é que significativa parcela da opinião pública, não raro, tem demonstrado uma certa tendência em visualizar com benevolência (quando não simpatia) as ações terroristas de caráter revolucionário. Quando os integrantes de uma determinada organização realizam atividades caracterizadas por níveis extremados de violência, inclusive com baixas entre inocentes cidadãos comuns, desde que se divulgue que as suas motivações foram de ordem político-ideológica, isso por si só, seria o suficiente para não mais enxergá-los como hediondos assassinos frios e calculistas, mas, sim, como heróicos combatentes que estão corajosamente prontos a se imolar pelos mais nobres ideais de liberdade.
Uma crescente antipatia, e até mesmo revolta, pelas posições adotadas pela política de relações exteriores do governo dos EUA tem contribuído significativamente para que mesmo autoridades governamentais manifestem o seu pretenso dilema, entre considerar tais revolucionários como terroristas ou como idealistas exemplares.
Por outro lado, observa-se que, muito frequentemente, o noticiário internacional tem levado a opinião pública de vários países a visualizar as comunidades muçulmanas, de uma maneira geral, como tremendamente perniciosas e, sobretudo, altamente perigosas. Essa visão que, via de regra, origina-se numa propaganda profundamente estereotipada, possibilita o aparecimento, totalmente injustificado na maioria dos casos, das mais torpes e covardes formas de preconceito.
Outro aspecto que, não raro, a opinião pública entende como altamente controvertido é o rigor eventualmente verificado nas ações contra terroristas.
Nas primeiras horas de 14 de outubro de 2001, um domingo, um dos líderes do Hamas, Abdel Rahman Hamad, após haver concluído as suas preces, colocou-se de pé na cobertura de sua casa. Numa fração de segundo, viu-se alvejado no peito por dois projéteis que o mataram instantaneamente. Esta ação executada por um atirador de escol israelense, foi o coroamento de uma operação de inteligência de alguns meses. Abdel Hamad era o coordenador das ações envolvendo o emprego de terroristas suicidas de sua organização.
Eventos como esse caracterizam um programa, identificado na mídia internacional como “targeted killing” , conduzido pelos órgãos de segurança israelenses, extremamente relevante no contexto de sua campanha de contraterrorismo. É importante ressaltar que as autoridades israelenses jamais confirmaram a existência de tal programa. As críticas a essa forma de conduzir “a guerra contra o terror” têm se mostrado bastante contundentes e originam-se em diferentes partes do mundo, inclusive nos EUA (muito embora tenham arrefecido nesse País, após o 11 de setembro).
Não há dúvida de que procedimentos dessa natureza contrariam ostensivamente qualquer política de direitos humanos, bem como estão em confronto direto com as leis internacionais. O dilema em questão é como os órgãos de segurança vão aproveitar de forma compensadora as raras oportunidades de golpear decisivamente as organizações terroristas que combatem, ao mesmo tempo em que evitem que os líderes capturados venham a ser objeto de ações terroristas futuras, que demandem a sua libertação em troca por reféns?
Destaque-se que as situações de resgate de reféns são as mais críticas a serem enfrentadas no contexto das operações contraterrorismo. Estas não permitem outra opção que não uma ação rápida e violenta, baseada na surpresa e na ação de choque, que não possibilite aos terroristas qualquer reação contra os reféns. Não é por mero diletantismo que as mais capacitadas unidades de Forças Especiais do mundo adestram-se intensiva e o mais realisticamente possível, num tipo de instalação internacionalmente conhecida como “killing house”, visando estarem preparadas para eventos dessa natureza.
A verdade é que tanto as operações preventivas quanto as repressivas, frequentemente se deparam com complexas situações onde está presente uma desconfortável ambiguidade naquilo que se refere aos aspectos legais e morais. E a realidade tem demonstrado que as decisões críticas a serem tomadas devem estar nas mãos de autoridades absolutamente conscientes de sua responsabilidade no que se refere ao êxito ou ao fracasso do combate ao terrorismo.
Artigo: Gen Bda Res Álvaro de Souza Pinheiro